Interessa?
Cruzaram-se na estação de metro, a uma hora qualquer. Um, caminhava seguro, escorreito, pontual, no seu fato e gravata, de mala hermética e atitude rígida. Outro, em restos de embriaguez, esticava a camisola andrajosa e esforçava-se por se manter acordado, a falar consigo mesmo, sem cair redondo.
Pediu este áquele, "dá-me uma moeda...?".
Nada.
"Dá-me lá uma moeda, pá".
"Vá lá!", insistiu.
"Porque é que te hei-de dar uma moeda? Para quê?" - respondeu o primeiro.
Nada, nada.
"Dá lá uma moeda...", reforçou o segundo.
"Não queres dar? Mas não queres, porquê?" - interrogou-o.
Nada.
Continuou, "diz lá, não dás porque não tens, porque não podes, ou porque não queres dar? Diz ao menos isso..."
Fez-se silêncio na estação.
Interessa, afinal, porquê?
Não!
Interessa...
(Paris, França)
1 Comments:
Dizer realista seria retirar o mérito ao texto. Impassivelmente sincero. Objectivamente. Quase posso assistir a esse diálogo. E pensar: interessa? Parece-me que já é um ponto de partida se pararmos para nos perguntarmos.
Obrigada por me lembrares que reflectir é sempre urgente.
Enviar um comentário
<< Home