segunda-feira, novembro 27, 2006

Anónimos em cascata

As reuniões e organizações dos alcoólicos anónimos fazem parte do nosso cenário urbano e social. Desde há dezenas de anos, são inúmeros os grupos e iniciativas de apoio aos antigos alcoólicos e alcoólicos, na sua recuperação e reintegração numa vida perigosamente vivida ao lado do alcoól. São muitos os livros, teses, trabalhos, reportagens e filmes sobre o tema.
Surgiu depois, de forma quase inexorável, um novo fenómeno paralelo: o do conforto aos familiares e amigos dos alcoólicos e ex-alcoólicos e dos que com eles vivam. Emergiram novas estruturas de apoio psicológico, emocional e afectivo a todos os que sofrem com a convivência e proximidade de alcoólicos, anónimos e não, agora também carentes de outro apoio, que os ajude a manter a vida estreita com aqueloutros.
E por aí fora. Um dia, andaremos a criar apoios aos amigos dos amigos dos que convivem com aqueles, após os quais se encontrará a necessidade de estabelecer uma rede para dar apoio também a estes e depois a estes por aqueles. Um processo cada vez mais complexo, individualizado, segregado, perdendo-se ao longe as causas e o problema principal.
Não duvido das necessidades subjacentes. Pergunto-me só se esta é a via mais eficaz para resolver os verdadeiros problemas, ou se não será apenas para criar uma cascata de desresponsabilização social, de diluição progressiva da responsabilidade de cada um no sentimento de culpa de todos, para que a ninguém nada seja nunca exigido e tudo possa ir ficando, no pântano da caridade e do apoio psicológico. Interminável.
Não conseguiremos fazer melhor que isto? Não conseguiremos ajudar a formar pessoas que saibam exigir a si mesmas?
(Almada)

quinta-feira, novembro 23, 2006

Chapéu na casca

Há estranhos indicadores sobre os outros e o que deles esperamos, que nos conformam muito os comportamentos. Tenho para mim a sensação de insegurança proveniente de um condutor de chapéu de felcro, dentro da sua lata, por essas estradas e ruas fora.
Tenho a amarga intuição de que um idoso de chapéu posto, a conduzir, poder vir a ser uma fonte de risco para a segurança rodoviária. Assuta-me!
Não é de agora nem de quando comecei a estar mais atento às notícias de condutores em contramão nas auto-estradas, identificados em grande maioria como street racers (um ou outro), mas sobretudo como condutores de certa idade. O que será certa idade ou a idade certa para não mais conduzir?
Por mim, já pedi aos meus, que me tirem da estrada, quando me virem, de chapéu enfiado, dentro da minha lata, em condução.
(Almada)

sexta-feira, novembro 17, 2006

Congresso

Pelos caminhos de Portugal, lá fui em romaria a Santarém, participar no Congresso do PS. Ir a Santarém é sempre um prazer, considerado o desprazer dos dias e noites em que por ali me esfolei, rastejei e arrastei na recruta do serviço miltar obrigatório (ainda sou desse tempo, vejam lá). O prazer dos espaços, das cores, das comidas, das estórias, das belas fatias de portugalidade, que dali se podem entrever.
O Congresso foi uma estopada, diria o Eça. Uma sala quadrada, em forma de ringue de boxe, sem pugislistas (por falta de comparência e receio de KO?), forrada a preto por fora e amarelo por dentro, com uma entrada de 2 metros, em túnel quadrado. Tudo devidamente encaixilhado num pavilhão enorme, capaz de albergar um espaço bem maior.
Ironicamente, o espaço interior era diminuto para os mil e tal acotovelados nas improvisadas trincheiras do trabalho congressista. Dimensionaram o espaço à medida das ópticas televisivas, dos ecrãs e da imagem, sem espaço para as pessoas, as palavras e o debate congressista.
Foi um congresso do líder com o país, mediado pelas TV's, com mil e tal figurantes que a ambos aplaudiram convictamente.
(Lisboa)